O egoísmo miserável desses sub-humanos

Enojam-me as pessoas carentes, de tal modo que não consigo sequer tentar suprir-lhes a carência e contribuo para a decadência da relação a dois à qual pertenço sem intenção.

Contribuo para a decadência do ser humano visto da perspectiva de outro. Para a vergonha sem consciência de a ter, de andar em público com o corpo à mostra, com um corpo feio e decadente de quem não volta a recuperar a forma inicial.

Irrita-me a falta de capacidade de auto-análise das pessoas que sofrem, da forma como ignoram os sinais dos outros sobre a triste figura, do sentido mesquinho e exagerado que dão a um acontecimento nascido da natureza para os violar.

Essas pessoas que crêem ser o centro do universo, num renascimento pretensioso baseado no coitadinhismo ortodoxo, essas carpideiras egoístas sem vontade de relativizar a dureza da vida.

Dão-me vómitos. Gritar-lhes-ia ao ouvido que o mundo não é deles, e que nem sequer deles se lembra, nem para eles foi criado, que morram sozinhos pela incauta forma de se dar e se mostrar aos outros.

Burros que não entendem que eu sou o único ser vivo que se pode orgulhar de sofrer com todas as letras, e cujo martírio ficará escrito na mente dos homens como o exemplo daquele que sofreu sem ter culpa de o fazer e contra a sua vontade.

empregado do mês

a semana passada cruzei-me com o tipo do restaurante que fica por baixo da casa da Joana. disse-lhe olá, ele como não estava à espera, ignorou-me. ele vinha com a farda do trabalho, camisa preta, calças brancas, caneta no bolso da camisa. não, ao contrário, camisa branca, calças pretas, obviamente. cabelo cheio de gel ou brylcreem ou óleo das batatas, penteado para trás-esquerda. fiquei a vê-lo, ia ter com uma rapariga do outro lado da estrada. era loira, gordita, mamas grandes, um estilo de roupa muito em voga na Malveira da Serra, e uns Aviator iguais aos meus.

deu-lhe um beijo na boca. ela agarrou-lhe nas mãos e ficaram a falar, ela sorria mais que ele. ele soltou as mãos e tirou um cigarro. falaram bastante tempo, basicamente o tempo da Joana descer desde que eu tinha tocado, uns 10 minutos. no fim despediram-se, ela sorrisinhos, ele Chuck Norris. enquanto ela meteu o capacete e montou a Vespa, ele atravessou a rua, passou por mim, disse-lhe olá, ele ignorou-me.

A Joana chegou nesse momento, passou por ele distraída, a compor o decote, ele, todo sorrisinhos, não estava nada distraído e disse "olá boneca!" a Joana riu-se e disse olá. perguntei-lhe se ele lhe chamava boneca sempre que a via, ela ridicularizou-me, perguntou se eu tinha ciúmes do empregado do restaurante. não era isso que estava em causa, expliquei-lhe. em ti eu confio, nele não, ainda por cima digo-lhe olá e não me responde, deve ser mesmo porque me vê como um rival do engate. "ele nem sabe quem tu és!" respondeu-me. raiva. então não sabe? fomos lá jantar no outro dia, da vez que nos chateámos porque os empregados passaram a noite toda a olhar para as tuas mamas. "sim, e tu achaste que a culpa era minha", eu não achei que a culpa era tua, só queria que estivesses mais complacente com a minha causa e não ignorasses quando te chamei a atenção para isso. "então preferias que lhes desse atenção? se calhar devia ter dado" não é atenção a eles, é atenção ao que eu te estava a dizer, podia não ter assim tanta importância mas ganhou-a assim que não deste importância nenhuma. merda, não queria discutir com ela "não quero discutir contigo, mas tu és difícil, tenho que te ignorar para não nos chatearmos", eu é que tenho que te ignorar, disse ela. "mas isso já tu fazes sempre" disse eu. "merda zé, acabei de sair de casa, já estás a fazer isto".

"desculpa, esquece lá isto então... achas o gajo giro?" ela riu-se, muito alto. pensei que era sinal que não, mas ela disse que sim. "tem pinta", pinta de chulo?, "não, tem um charme qualquer, tem pinta de empregado de restaurante, mas isso até lhe dá piada". não entendo. achas piada a pessoal de farda, é isso? "não, é qualquer coisa especial, é giro, tem expressões fortes, cara máscula" coisa que eu não tenho? "não, tu tens mais cara de puto"... sempre esta merda. cara de puto é uma coisa muita fixe quando se quer andar em carroceis sem levantar suspeitas mas serve de pouco quando se quer ter a certeza de que a namorada tem tesão por nós, em alturas que ela nos compara a um gajo com cara "máscula", a quem acha "piada". eu é que comparei??? disse ela.

ontem já deitados, durante os preliminares de qualquer coisa, lembrei-me de lhe dizer que a conversa da semana passada veio a propósito do gajo ter ido falar com uma rapariga que me pareceu namorada dele. "não, ele não tem namorada" ??? perguntei-lhe como é que sabia, ela disse-me que falou com ele durante a semana que passou. e não me disseste nada? "já sabia que ias ficar com ciúmes" porque é que ia ficar com ciumes, há razões para isso? "não". raiva. mas falaste com ele porquê? "foi ele que falou comigo", epá, ó Joana, ajuda-me lá um bocado nisto, ainda a semana passada falámos dele, agora sabias que era do meu interesse e não me dizes que estiveste a falar com ele, ainda por cima acerca de namorados? também lhe disseste que não tinhas namorado? "ó zé, vai à merda". puxou a t-shirt para baixo e virou-se para o outro lado. eu ainda tive que procurar as minhas cuecas no intervalo entre o colchão e a cama.