mestre dobras

saí hoje de casa com a perfeita noção de que não era um dia bom para ir mostrar-me para uma universidade. sentia-me com o estilo do Eládio Clímaco num dia de folga, se ele vivesse numa barraca. voltar à minha universidade traz sentimentos contraditórios. quando lá andei as raparigas tinham o estilo que se esperava de uma universitária, pullover pelos ombros, mangas dobradas, sapatões de vela com sola todo-o-terreno, poupas com gel. não, minto, isto era no secundário, na universidade usavam botas das obras e os cabelos eram ondulados por electricidade estática, e na universidade já havia uma ou outra rapariga que fazia professores e alunos comportarem-se como macacos, sim, havia uma ou outra que, dada a raridade, eram deusas (dos anos 90, convenhamos) simplesmente nunca eram da minha turma, eram da turma de um gajo qualquer das tunas. hoje as universitárias são modelos e actrizes e os universitários também. têm corpos de modelos fotográficos, trejeitos de estrelas de rock, têm a superficialidade social de colunáveis desempregados, mas têm memes próprios e uma estética geracional, que me deixam a leste dos conteúdos e das razões das suas gargalhadas e soberba. entrar numa universidade e ser completamente ignorado por hordas de gajas giras vestidas de forma comovente é uma experiência hostil para alguém que sente que no fundo não devia estar ali. ou aqui ou além. foi como a experiência de voltar ao meu infantário passados dois anos de ter saído de lá, por insistência da minha mãe, que as educadoras me queriam ver, tinham saudades e o caralho (andei lá até aos 9). quando lá cheguei ninguém sabia quem eu era, só havia educadoras que não foram minhas educadoras, os putos mais novos que nunca foram meus amigos, cresceram e não se lembravam de mim, alguns já tinham buço. na secretaria ignoraram a emoção de uma mãe pela boca de um puto de 11 anos, disseram que se quisesse podia passear pelo infantário, mas depois tinha que me ir embora. na universidade não me dizem para ir embora porque simplesmente não dão conta que estou ali, excepto a senhora da biblioteca "tá na hora de arrumar, vamos fechar daqui a 10 minutos" já sei caralho! ontem foi a mesma merda, não demoro 10 minutos a meter o computador na pasta, que idade é que julga que eu tenho? a minha tendência involuntária para perseguir ambientes do meu passado deixa-me desagarrado, anacrónico e sem grupo social. basicamente as mulheres são o meu barómetro de inserção, se me ignoram não pertenço, e tenho sido muito ignorado nos ambientes em que me movo, excepto por cinquentonas fogosas. anda foda-se, arruma as tuas merdas e baza daqui, diz-me uma bibliotecária ao ouvido.

5 comentários:

Marta disse...

fizeste-me lembrar de um estupidez que fiz há dias: levei o meu filho ao antigo infantário e o amigos já lá não estavam, e a educadora foi despedida, e a cozinheira estava de férias... e ele a fazer beicinho.

disse...

descansa, fizemos o mesmo há duas semanas mas a creche tinha feito a ponte do Carnaval, nem saímos do carro. interpretámos isso como um sinal.

Marta disse...

às vezes não percebo que raio de coisa é esta que me obriga a regressar tantas vezes ao passado (ou a frustrar-me na tentativa de o fazer)

Courage my love disse...

En não volto à minha faculdade para não me lembrar que troquei uma profissão apaixonante e nobre em que era muito boa por uma fútil e criativa em que apenas sou mais ou menos.

Fartei-me de rir com essa do barómetro! ha ha ha! Muito bom.

Surpresa disse...

Eu sentir-me-ia derrotada se fizesse essas coisas, talvez seja por isso que fujo do meu passado.

E já agora, estou mesmo contente por ter encontrado este blog, adoro!